segunda-feira, 2 de novembro de 2009

KITO



Um dia, Um velho foi visitar mestre Ryokan e disse-lhe:

- Eu quisera pedir-vos que fizésseis um kito "Cerimonia para cumprimento de uma promessa" em minha intenção. Assisti à morte de muita gente ao meu redor. E também deverei morrer um dia. Portanto, por favor, fazei um kito para eu viver por muito tempo.

- De acordo. Fazer um kito para viver muito tempo não é difícil. Quantos anos tendes?
- Apenas oitenta.
- Ainda sois jovem. Diz um provérbio japonês que até os cinqüenta anos somos como crianças e que, entre os setenta e os oitenta, precisamos amar.
- Concordo, fazei-me então um bom kito!
- Até que idade quereis viver?
- Para mim, acho que basta-me viver até os cem.
- Vosso desejo, na verdade, não é muito grande. Para chegar aos cem anos, só vos resta viver mais vinte. Não é um período tão longo assim. E sendo o meu kito muito exato, morrereis exatamente aos cem anos.

O velho ficou com medo:

- Não, não! Fazei que eu viva cento e cinqüenta anos!

- Atualmente, tendo atingido os oitenta, já viveste mais da metade do prazo que desejais. A escalada de uma montanha exige grande soma de esforços e tempo, mas a descida é rápida. A partir de agora, vossos derradeiros setenta anos passarão como um sonho.


- Nesse caso, dai-me até trezentos anos!


Ryokan respondeu:

- Como o vosso desejo é pequeno! Somente trezentos anos! Diz um provérbio antigo que os grous vivem mais de mil anos e as tartarugas dez mil. Se animais podem viver tanto assim, como é que vós, um homem , desejais viver apenas trezentos anos!

- Tudo isso é muito difícil...- tornou o velho, confuso. - Para quantos anos de vida podeis fazer-me um kito?


- Quer dizer, então, que não quereis morrer! Eis aí uma atitude de todo em todo egoísta... - replicou o mestre.


- Bem, tem razão....- respondeu o ancião, constrangido.

- Assim sendo, o melhor é fazer um kito para não morrer.
- Sim, é claro! E pode ser? Esse é o kito que eu quero! - o velho animou-se bastante.
- É muito caro, muito, muito caro, e leva muito tempo...
- Não faz mal. - concordou o velho.

Ajuntou, então, Ryokan:

- Começaremos hoje cantando apenas o Makka Hannya Shingyo; a seguir, todos os dias, vireis fazer zazen no templo. Pronunciarei, então, conferências em vossa intenção.
Dessa maneira, de uma forma suave e indireta, Ryokan fez o velho homem deixar de se preocupar com o dia de sua morte e o conduziu ao Dharma.


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Eu coloquei esse vídeo do Filme "A PARTIDA" em que fala sobre a cultura japonesa acerca dos rituais e arrumação dos mortos. Um filme muito interessante, com uma trilha sonoro muito bonita.

Espero que gostem
Namasté



6 comentários:

angela disse...

Muito interessante o post, a maneira suave com que o mestre conduz a libertação da angustia do velho é bem Zen.
O filme citado e a musica são maravilhosos, de uma delicadeza fantastica.
beijos querido

Peregrina da Luz disse...

Muito bonito Hugo essa mensage, esse vídeo é lindo, eu já conhecia.
Namasté

Norma Villares disse...

Amigo querido, muito bom o post.
Esse mestre é muito gentil e suave.
O filme eu já conhecia, musica é maravilhosa.
Abraços

soninha disse...

Um texto pra lá de maravilhoso!Não desejar morrer é não compreender a própria imortalidade.
bjs

Maria José Rezende de Lacerda disse...

Passei aqui para dar uma espiadinha e me alimentar de boa leitura. Deixo-lhe um grande beijo e um ótimo final de semana.
Amei o comentário de o Reino da Fantasia e vou pedí-lo emprestado, pois resumo tudo o que queria dizer. Beijos.

Viveka disse...

Um texto maravilhoso!
E a música lindíssima.
Namasté